Luís Miguel Barros • Associate Director and Architect
Surgem recentemente vários artigos provenientes dos USA, sobre a falta de capacidade de responderem aos “picos” e às “catástrofes” de saúde pública e questionando o seu próprio modelo de prestação de cuidados de saúde e de Edifícios Hospitalares.
Neste momento de crise mundial, em que de súbito todos estamos sujeitos a um problema de dimensão catastrófica, que não escolhe classes, nos obriga a afastamento e, no processo, destrói as bases da economia como a conhecemos, não posso deixar de me recordar de um aspecto que sempre esteve presente nos inúmeros programas hospitalares que fomos fazendo nestes últimos anos.
Nos programas de matriz pública Portugueses (emanados do saber dos técnicos das Construções Hospitalares, depois DGIES, depois ACSS) sempre houve a preocupação de dimensionar a Rede, os Serviços, Unidades Funcionais e Edifícios não só para uma situação de “pico” mas também para uma situação de “catástrofe”, incluindo a Infecciologia nesses parâmetros. Provavelmente um reflexo dos problemas que Portugal teve até 1974 (mas não só…) no continente e também nas colónias.
Esta preocupação foi-se perdendo nos últimos anos, talvez porque seja difícil de justificar o custo de áreas equipadas que aparentemente não servem para nada… Os mecanismos de financiamento dos projetos Hospitalares, as montagens de PPP, de esquemas de retorno financeiro puramente imobiliários, etc. não ajudam nesta análise que se quer fria e objectiva: um dia pode ser necessário e por isso temos de estar preparados.
Na prática a linha que tem prevalecido é a de fazer Edifícios Hospitalares que apenas contemplem o que seja necessário no presente e, através de cálculos que antecipam “um” futuro, sejam capazes de crescer e acomodar os crescimentos programados durante o período de amortização do financiamento…
Criou-se toda uma teoria sobre flexibilidade e modularidade que, sendo essencial num Edifício Hospitalar, não pode comportar situações como estas que estamos a viver. São excepcionais, catastróficas.
Teremos nós, Sociedade Ocidental, pensado que estávamos livres das doenças infecciosas? Excesso de confiança? Falta de humildade?
É imperdoável se não usarmos a capacidade dos nossos técnicos de saúde, o nosso engenho e conhecimento técnico, a própria Rede pública e privada – reconhecidos internacionalmente como parece estar a emergir…
Não nos podemos voltar a esquecer dos ensinamentos, fundamentados em experiência multidisciplinar, que temos em Portugal, aplicando-os aos Edifícios de Saúde de forma sistemática, sem se perder a inovação nas técnicas de tratamento e nos novos modelos de organização Hospitalar.
Utilizar o novo paradigma dos cuidados ambulatórios como forma de segmentar e “compartimentar” os tratamentos – em casos de doenças infecciosas é o desejável face ao modelo de “concentração” em Edifícios de Saúde gigantes e monolíticos, que facilitam a propagação.
Incluir naqueles a capacidade de responder aos desafios de catástrofes e epidemias que, num mundo global, se tornam elas próprias globais muito rapidamente.
Manter o que de bom sabemos fazer, acreditar nisso e exportar esse conhecimento, pô-lo ao serviço dos outros.
Cabe-nos a nós, Arquitetos, defender estes princípios, utilizá-los, provocar o seu desenvolvimento e não os abandonar.