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O conforto como argumento principal para a sustentabilidade

Por Duarte Marques Nunes, Gestão da Sustentabilidade e Arquiteto

"A raça humana está posicionada num tempo que antecede uma grande mudança. Em nenhum momento da história nos deparamos com um desafio maior... hoje trata-se de resgatar o meio ambiente e preservá-lo como base da vida tal como a conhecemos. O século XXI marcará a altura em que o impacto dos seus habitantes humanos terá o potencial de destruir a sua capacidade de nos sustentar."

Ernst von Weizsäcker

"Uma ideia é salvação pela imaginação."

Frank Lloyd Wright

"O design pode ser uma ferramenta poderosa para o bem."

Mariam Kamara

Pode a arquitetura confortável ajudar-nos a navegar neste labirinto?

INTRODUÇÃO

A humanidade enfrenta desafios ambientais sem precedentes, no século XXI. Como von Weizsäcker et al. (2009) destacam, chegamos a uma conjuntura crítica onde o nosso impacto no planeta ameaça a sua capacidade de sustentar a vida. No seu influente livro ‘Factor Five: Transforming the Global Economy through 80% Improvements in Resource Productivity’, publicado em 2009 sob a forma relatório para o Clube de Roma, os autores propuseram que a humanidade estaria no auge de uma nova era de desenvolvimento. Eles defenderam que estavam reunidas as condições para o surgimento de um "Ciclo Verde de Kondratiev" ou a "6ª Onda de Inovação", com a sustentabilidade como elemento basilar.

Entre inúmeras iniciativas, a Indústria 5.0 da União Europeia destaca-se como um excelente exemplo desta mudança. Uma transição que surge uma década mais tarde para dar corpo a transformações tanto digitais quanto ‘verdes’. Esta evolução baseia-se na estrutura 4.0 pré-existente, mas incide sobretudo na pesquisa e inovação para promover uma abordagem industrial sustentável, resiliente e centrada no ser humano. Embora enraizados na Europa, estes princípios têm aplicabilidade global, enfatizando a necessidade urgente de um equilíbrio harmonioso entre o desenvolvimento e a gestão ambiental.

Neste contexto, a arquitetura emerge como uma ferramenta fulcral para enfrentar a crise climática, a transição energética e as complexidades socioeconómicas. A construção é responsável por aproximadamente 39% das emissões globais de dióxido de carbono relacionadas com a energia (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, 2022) e por mais de 30% da pegada ambiental da União Europeia (Agência Europeia do Ambiente, 2024). Este impacto significativo destaca a necessidade de uma arquitetura centrada no ser humano, criando soluções sustentáveis que tragam conforto à vida quotidiana, mitigando e revertendo os danos ambientais. Historicamente, o conforto tem sido visto como uma necessidade humana fundamental, com Laugier (1753) a traçar as origens da arquitetura à cabana primitiva projetada para fornecer abrigo e conforto face aos elementos. Este princípio continua relevante, tal como defendido por Yun e Kim (2014) acerca da importância perene do conforto no design arquitetónico. Por outro lado, no contexto da sustentabilidade, o conforto deve ser redefinido para superar o mero conceito de conveniência individualista.

O ‘conforto sustentável’, expressão escolhida para informar este ensaio, deve abranger uma perspetiva mais ampla que considere o bem-estar das gerações futuras e o equilíbrio ecológico do planeta. Esta reinvenção do conceito de conforto pode impulsionar a inovação sustentável, potenciando um processo de projetar que responde às necessidades presentes contemplando o futuro. Este artigo explora o conforto como elemento central da sustentabilidade, defendendo uma mudança de paradigma onde o conforto não é meramente uma busca pessoal, mas uma responsabilidade coletiva. Ao repensarmos o conforto, podemos desbloquear o seu potencial como catalisador para um futuro mais sustentável e harmonioso.

O QUE É CONFORTO ALÉM DO IMEDIATO?

O conforto, no seu sentido contemporâneo, evoca frequentemente imagens de interiores luxuosos e climatização ajustável. No entanto, a sua etimologia revela uma origem mais profunda. Derivado do latim confortare (fortalecer), o termo outrora incorporava ideias de apoio e resiliência (Oxford University Press, 2025). Ao longo do tempo, o seu significado evoluiu para dar prioridade à conveniência, reflexo das mudanças sociais. No entanto, no século XXI, esta compreensão deve expandir-se.

O verdadeiro conforto transcende as sensações fugazes. Incorpora o bem-estar mental, social e ambiental. No contexto da sustentabilidade, o conforto deve ser redefinido como uma aspiração partilhada a longo prazo, e não como uma indulgência imediata. Para atingir este objetivo, a arquitetura deve abraçar as seguintes dimensões:

Conforto Físico e Ambiental: O design sustentável pode criar ambientes otimizados através de estratégias como o arrefecimento e aquecimento passivos, maximização da luz natural, garantia de uma boa acústica e manutenção de uma qualidade do ar incrementada no interior dos espaços. Estas técnicas podem aumentar o conforto diário e minimizar o consumo de energia e o impacto ambiental.

Conforto Psicológico e Emocional: O design biofílico, que integra a natureza no ambiente construído, promove a calma, reduz o stress e aumenta a criatividade (Browning et al., 2014). Recursos como vegetação, materiais naturais e vistas para o exterior ajudam a colmatar a lacuna entre os habitats humanos e o mundo natural, enriquecendo a vida quotidiana de forma holística.

Conforto Social: A inclusão é parte integrante do conforto sustentável. Isso envolve a criação de espaços equitativos onde necessidades básicas como água potável, saneamento e habitação a preços acessíveis sejam universalmente acessíveis. Além disso, é vital abordar as desigualdades globais: enquanto as nações desenvolvidas representam apenas 18% da população global, são responsáveis por 60-70% das emissões, deixando milhares de milhões sem acesso a recursos essenciais. Abordar esta disparidade é um imperativo moral.

Conforto Intergeracional e Interespécies: O conforto deve estender-se às gerações futuras e a outras espécies. Esta ‘ética do conforto’ exige decisões que deem prioridade à eficácia do uso de recursos, à preservação da biodiversidade e à circularidade. Neste contexto, a arquitetura pode apoiar um planeta próspero, passando da mera eficiência para a regeneração.
Ao abraçar estas dimensões, o conforto pode tornar-se uma base sólida para a sustentabilidade. Transforma-se numa responsabilidade partilhada, abrindo caminho para um mundo onde o bem-estar e o equilíbrio ecológico coexistem.

CONFORTO COMO CATALISADOR PARA A INOVAÇÃO

A arquitetura é muito mais do que desenhar espaços; molda a forma como vivemos, pensamos e interagimos com o nosso ambiente. Quando visto através da lente da sustentabilidade, o conforto tem o potencial de se tornar um motor de inovação.

Design Passivo: Técnicas como otimizar a luz natural, o fluxo de ar e a inércia térmica reduzem o consumo de energia e aumentam o conforto. O design passivo é a pedra angular da arquitetura sustentável, provando que a simplicidade e a engenhosidade muitas vezes produzem as melhores soluções.

Conexões Biofílicas: Edifícios projetados com princípios biofílicos diluem a linha entre o interior e o exterior. Recursos como paredes verdes, iluminação dinâmica e a presença de água criam ambientes que promovem o bem-estar físico e psicológico. Esses espaços inspiram a criatividade e estabelecem uma profunda conexão com a natureza.

Agência do Utilizador: Designs inovadores possibilitam que cada habitante ajuste o seu ambiente. Espaços personalizados que permitem o controlo sobre a iluminação, ventilação e temperatura aumentam o conforto e promovem o sentimento de propriedade. Esta interação dinâmica entre as pessoas e o seu ambiente incentiva comportamentos sustentáveis.

Arquitetura Regenerativa: O futuro da arquitetura reside na criação de edifícios que devolvem mais do que recebem. Os designs regenerativos desenvolvem-se numa relação de harmonia com os recursos naturais locais, utilizando energia renovável, reforçando o ciclo local da água e dos nutrientes, atingindo a neutralidade carbónica e revitalizando ecossistemas. Esses edifícios visam não apenas a neutralidade, mas também deixar um legado positivo.
Ao adotar estes princípios, a arquitetura pode enfrentar os desafios ambientais urgentes e enriquecer a experiência humana. Neste paradigma, o conforto torna-se uma fonte de inspiração e um caminho para a resiliência, que por sua vez é o nosso caminho para a perenidade sustentada.

REPENSAR CONFORTO COMO MEDIDA DE PROGRESSO

À medida que reimaginamos o progresso, o conforto tem o potencial de emergir como uma métrica central das sociedades sustentáveis. As cidades e edifícios futuros darão prioridade ao conforto como um reflexo da equidade, resiliência e gestão ambiental.

Sistemas Adaptativos: As tecnologias inteligentes personalizarão o conforto. Sistemas orientados por IA regularão dinamicamente a temperatura, iluminação e ventilação com base nas necessidades em tempo real, garantindo que os espaços permanecem reativos a diversos ocupantes.

Natureza Integrada: Espaços focados no bem-estar criarão uma simbiose equilibrada entre interior e exterior. Pátios verdes, terraços com zonas de sombra e áreas ajardinadas redefinirão a vida urbana, tornando a natureza parte integrante da vida quotidiana.

Impacto Regenerativo: A arquitetura futura, não só apoiará a saúde humana, mas também restaurará o equilíbrio ecológico. Os edifícios gerarão energia excedente, aumentarão a biodiversidade e revitalizarão os serviços de ecossistemas locais, estabelecendo um novo padrão de progresso.
Esta visão de conforto abre caminho para um roteiro de desenvolvimento sustentável. Ao incorporarmos estes princípios no desenvolvimento de políticas, no ato de projetar e na cultura, podemos redefinir o que significa prosperar em consonância com o planeta.

CONCLUSÃO: AS REPRECUSSÕES DO CONFORTO SUSTENTÁVEL

O conforto, reimaginado como um ideal holístico e sustentável, possui um poder transformador. Edifícios regenerativos que valorizam a biodiversidade, metabolismos circulares e inclusão servem de base para ecossistemas prósperos. As paisagens urbanas conectadas com a natureza otimizarão recursos, mitigarão as mudanças climáticas e promoverão comunidades resilientes.

Este efeito em cascata estende-se às gerações futuras, garantindo que o conforto deixe de ser um privilégio, para atingir o estatuto de direito universal. Ao abraçar o conforto sustentável, a arquitetura pode liderar o caminho na criação de um mundo onde o bem-estar, a equidade e a saúde ecológica são inseparáveis. O futuro do design reside na resolução de problemas e no desenvolvimento de uma relação mais profunda e regenerativa com o planeta.

Em última análise, o verdadeiro potencial do conforto reside na sua capacidade de inspirar. Quando integrado cuidadosamente, torna-se mais do que um objetivo – torna-se um princípio orientador para um futuro sustentável e harmonioso, onde todos os que habitam o planeta podem prosperar.





Browning, W.D., Ryan, C.O., Clancy, J.O. (2014). 14 Padrões de Design Biofílico. Nova York: Terrapin Bright Green llc.

Comissão Europeia. (2020). Indústria 5.0: Rumo a uma indústria europeia sustentável, centrada no ser humano e resiliente. Publicação Editorial da União Europeia.
Agência Europeia do Ambiente. (2024). Últimos relatórios e comunicados publicados pela Agência Europeia do Ambiente. Comissão Europeia. Recuperado em 20 de janeiro de 2025, de https://environment.ec.europa.eu/news/latest-reports-and-briefings-published-european-environmental-agency-2024-12-16_en

Laugier, M.-A. (1753). Ensaio sobre Arquitetura. Paris: Chez Duchesne.

Oxford University Press. (2025). Conforto. In Oxford English Dictionary (3ª ed.). Recuperado em 20 de janeiro de 2025, de https://www.oed.comhttps://www.oed.com/dictionary/comfort_n?tab=meaning_and_use#8984415

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. (2023). Materiais de construção e clima: Construindo um novo futuro. Recuperado em 20 de janeiro de 2025, de https://www.unep.org/resources/report/building-materials-and-climate-constructing-new-future

von Weizsäcker, E. U., Hargroves, K., Smith, M. H., Desha, C., & Stasinopoulos, P. (2009). Fator cinco: Transformando a economia global através de 80% de melhorias na produtividade de recursos. Um relatório para o Clube de Roma. Earthscan.

Yun, G. Y., & Kim, J. T. (2014). Criando edifícios sustentáveis através da exploração do conforto humano. Em 6th International Conference on Sustainability in Energy and Buildings, SEB-14. Departamento de Engenharia Arquitetónica, Universidade Kyung Hee, Yongin, Coreia.

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