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A Carta, o Revit e a Arquitetura

Por Luís Miguel Barros, Associate Director e Arquiteto

2020 foi um ano peculiar em vários aspetos, como todos sabemos e vivemos.

Um deles foi a original carta aberta de 5 páginas que em julho um grupo de 25 gabinetes de arquitetura britânicos enviou à Autodesk, mais precisamente ao seu CEO Andrew Anagnost.

Pessoalmente não ligo muito a “cartas abertas”, fazem-me lembrar sempre aqueles “Chihuahua” que ladram muito e não mordem nada e, francamente, o mundo estava nessa altura com preocupações maiores.

No entanto fui acompanhando de perto, não só porque me tornei responsável pela implementação do REVIT na S+A, mas porque faço a gestão das nossas 80 licenças e dos seus 150.000€ de custo anual (só Autodesk… sem contar com Microsoft, Sketchup, Adobe, Enscape, V-Ray, Rhino, Google, etc).

São os desenvolvimentos derivados desta carta que me proponho partilhar de seguida.



A Carta

Entre os signatários mais conhecidos da Carta Aberta estavam Zaha Hadid Architects, Grimshaw, Rogers Stirk Harbour + Partners, Wilkinson Eyre Architects, etc.

A carta basicamente censurava a Autodesk pelo aumento constante dos custos do seu software BIM, REVIT, cujo formato de aquisição, passando de licença perpétua a subscrição individual, e custo de licenciamento cresceu 70% em 5 anos. Em simultâneo apontava que o desenvolvimento desse software se manteve estagnado nesse período, sem responder às mais básicas necessidades dos seus utilizadores.

De forma muito clara, apontava à Autodesk uma responsabilidade direta sobre a ineficiência que se estava a revelar nos seus negócios, fruto da incapacidade do REVIT de acompanhar as novas necessidades no campo da Arquitetura e, devido a isso, se estar a tornar um fator de diminuição de produtividade.

A carta conclui pedindo que a Autodesk forneça um plano de ação “centrado no cliente, não belicista, inovador, progressivo e de entrega” que inclua, mas não limitado, a um compromisso com a estabilidade de custos; um compromisso de pesquisa e desenvolvimento adaptado às necessidades exclusivas da comunidade de Arquitetura e Design; uma vontade de estabelecer uma parceria cultural com seus clientes com base na “confiança, empatia e respeito” e, acima de tudo, “uma visão, programação e estratégia de investimento que vise agregar valor e desempenho para empresas de projeto que inclua a reformulação do Revit desde o início para refletir a funcionalidade necessária para uma indústria digital do século 21.”



A primeira resposta

Poucos dias após a publicação da carta aberta, a vice-presidente sénior da Autodesk, Amy Bunszel, respondeu. Bunszel é uma executiva com mais de 20 anos de Autodesk, uma pessoa de “produto” cuja credibilidade para falar de questões de “funcionalidade” é inatacável. Mas nada tem a ver com a política de licenciamento implementada nos últimos anos, nomeadamente a muito criticada política de “subscrição”. E muito menos tem a ver com a tática beligerante e agressiva da Autodesk relativamente às auditorias de software e como são utilizadas para aumentar as suas vendas. Essas são decisões executivas de um CEO – Andrew Anagnost – que tem de mostrar resultados aos acionistas de uma empresa que viu o seu valor de bolsa crescer 62% neste ano de pandemia, muito à custa de uma estratégia agressiva de vendas e aquisições, deixando o seu “produto” sem qualquer desenvolvimento.

Foi exatamente aqui que as coisas começaram a complicar-se para a Autodesk.

A Autodesk, previsivelmente, respondeu em modo “Relações Públicas” e tentou minimizar os danos. Bunszel afirmou: “embora não concordemos com tudo na carta, estamos comprometidos em ouvir”. Esse comentário serviu apenas para alimentar o fogo, e a “Social Media” entrou em ação. Para a grande maioria, não se tratava de custo e desempenho. Em vez disso, era sobre as promessas vazias da Autodesk de ouvir os clientes quando a história repetidamente demonstrou que este não é o seu modus operandi.

Mais uma vez, surgia o tom típico da Autodesk: a mensagem era mais sobre como isto tudo fazia sentido para a Autodesk e para “alguns” clientes, não sobre os aspetos específicos apontados na carta: funcionalidade de arquitetura, produtividade VS custo, adequação aos gabinetes de projeto de arquitetura, etc. Após esta resposta, as assinaturas na carta aberta ascenderam a largas centenas de gabinetes de todo o mundo.



A segunda resposta

Com a raiva a aumentar online, o CEO da Autodesk, Andrew Anagnost, finalmente respondeu, cerca de três semanas depois. Num “post” reconheceu i) o facto de que a funcionalidade de Arquitetura do Revit não progrediu tão rapidamente quanto deveria, ii) que a Autodesk falhou a entrega de uma nova plataforma de nova geração para AEC, iii) que os seus clientes tiveram de defrontar-se com múltiplas alterações no modelo de negócio da Autodesk; mas contestou muitos outros pontos da carta aberta original, i) nega que a Autodesk se envolva em práticas comerciais agressivas e frias, ii) nega que os custos de subscrição do software da Autodesk seja responsável pelo aplanar dos lucros das empresas de arquitetura, iii) nega que os custos de subscrição sejam muito superiores ao antigo modelo de licenças perpétuas. Foi uma resposta com partes iguais de desculpas e rejeição.

O pedido de desculpas é conversa corporativa clássica: chavões sobre desenvolvimento de produtos, declarações de atenção ao cliente, promessas de fazer melhor. Em contraste, a rejeição é muito mais emocionante. O mais memorável é que inclui a alegação bastante sarcástica de que para os dezassete signatários originais da carta aberta, as taxas anuais de licenciamento do Revit representaram apenas 0,63% de suas receitas de 2019…

Ora, custando uma subscrição de Revit 2950€, isso significaria que, por exemplo, a ZHA (Zaha Hadid Architects), com os seus 600 empregados, dos quais 500 serão utilizadores de Revit, teria um custo de subscrição anual de 1,47 milhões de euros e, pelas contas de Anagnost, receitas de 234 milhões de euros.

Acontece que em 2019 as receitas da ZHA, consideradas as melhores de sempre, cifraram-se em 62 milhões de euros… por isso os seus custos com a subscrição Autodesk seriam de facto 2,4% das receitas.

Pelas mesmas contas, a S+A devia ter tido receitas de 24 milhões de euros… Alguém andou a por a vírgula no sítio errado.



Pensamentos paralelos

Saliento que não estando eu de acordo com a Autodesk, não estou necessariamente a favor da ZHA e demais companheiros da carta. Sim, sou igualmente arquiteto, mas é notoriamente hipócrita da parte de Patrick Schumacher reclamar do custo do software e, ao mesmo tempo, defender estágios de arquitetura não pagos, “unpaid or low paid internships have nothing to do with exploitation…they are mutually agreed exchanges.”

Poucos estarão recordados da polémica vinda a público em março de 2019 sobre as condições ultrajantes dos estagiários não remunerados no escritório de arquitetura japonês de Junya Ishigami (designer do Serpentine Pavilion desse ano) – semanas de 6 dias, 13 horas por dia e os estagiários têm de trazer os seus computadores e software – que despoletou a descoberta de que esta prática era extensivamente utilizada por todo o lado, principalmente nos chamados “starchitects”, há largos anos. Há um artigo fantástico e bem documentado aqui, de um arquiteto australiano que, talvez mesmo por esse facto, tem uma clareza que só a distância sabe dar.

Ao tornar o REVIT um SaaS (Software-as-a-Service) cuja única forma de utilizar é ter uma conta individual na Autodesk, mobilizando uma “força policial” de auditorias invasivas, agressivas e bem documentadas, articuladas com as entidades governamentais e escudadas nas “letras pequenas” dos contratos de subscrição que ninguém lê, o seu uso abusivo foi quase totalmente erradicado.

Mesmo tendo em consideração que negociar com a Autodesk 500 subscrições não é o mesmo que negociar 80, duvido que estes nossos concorrentes paguem por cada uma o mesmo que nós, mas o que sei com toda a certeza é que quando o modelo era o das licenças perpétuas, a quantidade de licenças podia trazer descontos de 70% ou mais nas aquisições.

Apesar do modelo de “subscrição por utilizador” tornar sem dúvida os custos mais elevados, o facto é que nivela o valor por todos os players do mercado – o que poderá ter provocado esta reação mais forte dos nossos pares. Se beneficiam das centenas de estagiários desejosos de fazer currículo e dispostos a trabalharem sem o devido pagamento, são agora forçosamente obrigados a pagar a licença para que se utilize esse mesmo software.

Nada disto invalida, no entanto, uma crua realidade: o software da Autodesk custa anualmente e por colaborador mais caro do que todo o restante software junto (Microsoft, Sketchup, Adobe, Enscape, V-Ray, Rhino, Google, etc). É da mais elementar justiça que lhe exijamos qualidade, funcionalidade, inovação e seja intolerável esse software ser parte dos problemas e inútil no encontro de soluções.



O “valor” da Arquitetura

Durante anos ligada aos gabinetes de projeto, seguramente a Autodesk, que é uma corporação americana cotada em bolsa, viu há muito tempo que o seu potencial de crescimento estava na restante indústria de construção e não na Arquitetura e Engenharia… Detentora de um real monopólio, percebeu o óbvio: a cadeia de valor nos projetos e construção (AEC – Architecture, Engineering, Construction) estava toda na “Construction”, sendo esta entendida como tudo o que se segue ao projeto: consultorias, supervisões, construção, gestão, promoção imobiliária, vendas…

Afinal, os projetistas todos juntos “valem” uns meros 6 a 8% do custo global de construção de um empreendimento. Uma imobiliária cobra 5% do valor de venda de um espaço por nós projetado… Um simples exercício, conservador, de colocar os valores de venda em 2,5 X os valores de construção, mostra bem onde se encontra o peso nesta cadeia de valor. E a Autodesk passou os últimos 5 anos a posicionar-se para vender para os Donos de Obra, Empreendedores Imobiliários, Consultoras Imobiliárias… e o REVIT não tem qualquer interesse para estes.

No entanto ao descurar o seu “produto” em prol de mais e maiores “vendas” está a cair numa armadilha já bem conhecida. Vale a pena rever este excerto de uma entrevista com Steve Jobs, datada de 1995, sobre a relação entre produto e marketing numa empresa monopolista…

Na S+A, como Empresa de Arquitetura que preza a inovação e a qualidade, o que temos é de ter atenção e cuidado de não ficarmos reféns de uma ferramenta que se torne um subproduto cujas incapacidades futuras possam minar esse nosso desejo de inovar e aumentar a qualidade de forma permanente. E muito menos resignarmo-nos a este papel secundário num mercado onde apenas a visão, conceito e síntese criativa de um arquiteto consegue dar corpo e valor a algo que depois é explorado. Depende é de nós darmos menos “tiros no pé” …

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